Um lugar para realizar sonhos



Escolhi a prosaica vila de Cumuruxatiba, Bahia, para um breve descanso de janeiro.  Fui, mais uma vez,  pelo mar que banha essas terras espetaculares. Essa deve ter sido a oitava viagem à esse lugar. E outras virão.

A gente daqui é simples, astuta e trabalhadeira. Em um contraste com o que diz o senso comum que versa sobre a preguiça, o que vemos por essas bandas é uma gente humilde, sofrida em sua maioria. É uma população que acorda muito cedo e sai mar adentro em busca do ganha-pão com os pescados.
Sem o horário de verão, nascer do sol às 5h43
Bem antes do sol erguer-se no horizonte um inquietante “pó, pó,pó, pó, pó” dos motores de popa dois tempos ecoa sobre as plácidas águas da costa. Enquanto isso, outros vão plantar em uma terra fértil onde floresce de tudo. Inclusive, a felicidade. Já pensou quantas pessoas passam a vida em busca dela? Está de graça, aqui.

E há também aqueles que,  como eu,  ficam na vila por escolha. São pessoas que chegam como se estivessem em busca da terra prometida.  Canaã. E a encontraram. Quanta felicidade em poucos dias. É uma compensação maravilhosa pelos dias de apreensão, luta contra o relógio para entregar as tarefas do dia no trabalho e tantas amarguras. Amarguras necessárias até. O que seria nossa vida sem as dificuldades?.
Praia do Moreira, a cinco quilômetros da vila. Selvagem. Adorável
Entre pedaladas por praias cinematográficas, um almoço farto de pescados e uma rede para o descanso à tarde sob sombra de árvores frondosas,  arrumo tempo para escutar o mar e aguçar o olfato quarentão. 

Decisivamente, o cheiro daqui é indescritível. Rústico.  Único.  Só o estrangeiro consegue percebê-lo. Dizem que uma espécie de alga existente em um determinado trecho da praia do pier libera o aroma.  Se perguntarem com o que se parece dirigia para exemplificar que está perto daquele cheiro do lúpulo quando abre se uma cerveja holandesa.
Praia de Japara Mirim - uma falésia, um riacho doce e o oceano Atlântico
Ademais,  em  um lugar onde existe uma das maiores variações entre a alta e baixa da maré, sentir a energia daqui é espetacular.  Insubstituível.  É um lugar ideal para ouvir em Clube da Esquina 2, dos mineiros Milton Nascimento, Lô Borges e Márcio Borges que, “Os sonhos não envelhecem”. Escrevi na fina areia da praia essa encantadora frase. Faltou o complemento:

E basta contar compasso 
E basta contar consigo 
Que a chama não tem pavio 
De tudo se faz canção 
E o coração na curva 
De um rio, rio, rio, rio, rio 
E lá se vai... 
Mais um dia...”

Mesmo assim, inacabada, a frase chamou a atenção e foi fotografada.  

Não sei se é por causa da salinidade das terras ao redor, mas saboreio as frutas daqui como as mais doces e saborosas que conheço.  O abacaxi de Marataizes ficaria roxo de vergonha perto do sabor da fruta daqui,  vendida a R$ 2 a unidade na feirinha. 
Vista parcial da vila, ao amanhecer
Não delongarei nos relatos dos sabores da tapioca da Ana, do Acarajé da Cida, do bolo de aipim e doce de cacau da Lucinha, a moqueca de lagosta da Laudicéa, entre tantos outros pratos, cujas calorias consumi em frenéticos pedais das estradas litorâneas. Rodei em duas semanas em torno de 400 quilômetros entre idas e vindas de pedaladas. Saí com a certeza de voltar um dia. Gosto de repetir viagens a lugares com os quais me apaixono perdidamente.    
Pedal bate-volta de Cumuruxatiba a Corumbau. Ida e vida na mesma maré.

Comentários

Postar um comentário