Doce poder passageiro


Uma das coisas que me marcaram quando desembarquei no Vale do Aço, há uns 17 anos, foi um episódio dentro da Prefeitura de Ipatinga. 

Recém chegado à região, carecia de boas fontes e, um tanto quanto pela inexperiência, era daqueles repórteres que iam à prefeitura procurar pauta. 

Ainda bem que não demorou muito para descobrir que a verdadeira pauta não estava nos órgãos oficiais, mas nas ruas, com as fontes alternativas, com o povo, com os anônimos e não com os famosos e pseudo poderosos. 

Naquele tempo era praxe não gravar para a Itatiaia Vale do Aço. Antes de instituírem o jornal “Edição Vale do Aço”, às 06h30, os repórteres entravam ao vivo na programação quando tinham algo de novo a contar para os leitores, ops ouvintes (força do hábito). 

O então diretor da Itatiaia no Vale do Aço, Luiz Omar, tinha determinado que todos os locutores abrissem espaço a qualquer momento que os repórteres acionassem a central, das ruas.

A telefonia celular era precária e o que mais se usava mesmo eram os orelhões – naquela época eles funcionavam – e também havia o pedido para se usar o telefone fixo onde o repórter estivesse para as entradas ao vivo e, com isso, reportar fatos. Imediatismo era a palavra de ordem. Claro que posteriormente o método grava-corta-edita-produz, tornou o trabalho modorrento, cansativo e desatualizado.

Pois vejam que numa escaldante tarde, cumpria mais uma pauta imediatista. Pedi para ligar da ACS da prefeitura. Era no governo petista de João Magno de Moura. O Geraldinho deixou usar um fonefax numa salinha na ACS. 

Foi o terror. A chefe da comunicação – Áurea – se não me engano, chegou ao local e, ao me ver a usar o telefone, invadiu a saleta aos berros. Eu estava ao vivo e pedi ao locutor: “Amigão, espere aí porque tem uma mulher gritando aqui perto de mim. Deixa ver o que ela quer”. 

Ainda pude escutar o colega no ar:
- Bem, agora são duas horas e 14 minutos...vamos ver o que está acontecendo com nosso colega Alex Ferreira...

- O que foi, senhora?
- CÊÊÊÊÊE num pooooode usaaaar o telefooooone da ACS para ligaaaaar nãoooooo, vociferou ela.

Voltei ao ar e disse
- Vamos ter que desligar e voltamos com mais informações daqui a pouco porque querem usar essa linha aqui. Até mais amigão. Quem estava no ar, lembro-me bem, era o locutor Walace Martins.

A mulher recomendou:
- Ponha-se para fora, rapaz. 
- Tudo bem, já vou. 
Nem quis explicar que tinha pedido autorização de um funcionário, porque ele poderia ser a próxima vítima da ira da chefe da comunicação. Depois, em um orelhão expliquei aos ouvintes que houvera um mal entendido e que estava tudo bem. Mas não estava tudo bem nada. Fui vítima da intolerância e arrogância de uma pessoa destemperada. E tempestiva.

Mas foi assim. O governo se acabou, o João Magno não se sabe por onde anda mais. Nem a assessora. O Geraldinho, com sua serenidade e conhecimento, permanece na ACS. E eu continuo jornalista no Vale do Aço. Agora não preciso, nem meus colegas precisam, mendigar telefone da ACS nem de lugar algum para falar ao vivo. Sobram celulares para isso. 
No começo dos tempos era isso que tínhamos para trabalhar.  E nem sempre funcionava. Do tijolão ao iPhone evoluímos muito. Ou melhor,  será que evoluímos mesmo?
Mas há coisas que não mudam: A arrogância e a incompreensão daqueles que estão em  cargos passageiros, embriagados com a doçura de um poder que não é perene. Talvez tenham que agir assim mesmo pois, quem sabe, dessa forma sejam lembrados por isso, na falta de bons e produtivos feitos?

Entristece-me saber que tanto tempo se passou, o Vale do Aço tanto evoluiu e ainda hoje assessores – ou secretários – querem expulsar colegas jornalistas no cumprimento de seu trabalho, de dentro da prefeitura. Mas que tais pessoas não ocupem sua consciência quanto a isso. O ostracismo os aguarda. 

Comentários

  1. Como disse a assessora procê naquele dia, "rapaz", se queres conhecer a verdadeira personalidade de um ser humano coloque-o no puder...é aí que o lobo escondido na pele de cordeiro mostra os dentes e dá saudade daquele tempo que voce fala, do começo da rádio itatiaia vale do aço
    Abraço, Marcos - Recanto Verde

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  2. Olá Marcos. Obrigado pela lembrança daquele tempo que não volta mais e pela mensagem.

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  3. Cristiano Souza Linhares12 de fevereiro de 2012 às 10:20

    Grande professor, quanto tempo não trocamos algumas simples palavras cara, o que tá acontecendo com a gente. Belissímo texto cara, me lembrei das vezes que mesmo envergonhado tive que ligar ai lá no D.A para...... você sabe o que, pelo hoje isso acabou.
    Grande abraços cara, e muita saudados dos bons papos no cebola.

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  4. Jovem, sou tão aluno quanto você. Sabemos muito bem diferenciar quando o comportamento é profissional ou não, quando é pessoal ou apenas atendendo interesses vis. Vamos reviver dia desses um bom papo filosófico no Cebolinhas Man.

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