Entrevista com um burro

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A luz de "No ar" acende-se e a entrevista começa num ambiente devidamente higienizado e com o devido frescor do ar condicionado. Mas o clima interno não demoraria muito a esquentar com o andamento da entrevista a seguir. 

- Muito prazer em receber o senhor, Burro, aqui nos nossos estúdios.



- Bem, primeiramente vamos deixar claro, quem é mesmo o burro aqui, eu o ou senhor entrevistador?

O entrevistador incrédulo, óculos na ponta do nariz, calvície a brilhar sobre a testa, responde:

- Ora, eu entendo que seja o senhor.



- Bem, eu não mato meus semelhantes, não construo em áreas de risco nem planto alimentos transgênicos dos quais desconheço os efeitos de curso, médio e longo prazos, portanto...

- Mas cai barranco abaixo.



- Iiiiiihhh é raro, acidentes, de fato acontecem.

O entrevistador viu-se em maus lençóis naquele dia e arrependeu-se ter saído da cama.

- Caro burro, como o senhor se sente nesses tempos modernosos, em que a carroça já não é mais tão útil?

- Bem. Não preciso de nenhuma das inovações. Parece que vocês é que não se dão bem, pois vivem sempre a procura de novidades, insaciáveis. Quanto às carroças e cangalhas, não sinto falta delas. Fique-as com o senhor!

- O senhor é um mal agradecido.
- E o senhor é um impertinente!
- Burrooo!
- Você é quem é...

Fez um silêncio cabuloso no estúdio enquanto o diretor do programa tinha um ataque do coração e era socorrido pelo Samu. A entrevista do dia era um fiasco de conteúdo, uma baixaria. O ibope até crescia, mas a imagem da emissora ia pro pasto, literalmente.

- Seu burro, vamos deixar as ferraduras, digo, os ataques de lado e prosseguir com a entrevista?
- O senhor é quem manda. Foi o senhor quem parou – disse o burro resignado.

- Mas conta, solicitou o entrevistador – como é a vida de um filho da égua?
- Do mesmo modo que como o senhor vive.
- Como assim? Não sou filho de égua.
- Como não? Quando entrei aqui o produtor dizia "esse filho duma égua do entrevistador ... então deduzi que vossa genitora talvez, por um desses acidentes genéticos fosse uma equina também", disse o burro.
- Desgraçaaaadoooo! Ainda paaaaarto a cara daquele biltre.
- Calma, isso só vai leva-los a mais violência.

Novo momento de silêncio no ar. Podia-se ver as faces rechonchudas do entrevistador vermelhas de raiva prestes a explodir numa saraivada de gritos e xingamentos, raiva essa contida pela sua percepção de ter entrado numa burrada, digo, numa fria ao chamar o burro para a entrevista.

- Pois bem, dado ao fato de o senhor não saber responder educadamente e, só fala aresias, vamos por fim à essa conversa. Passar bem! - Tratou de concluir o entrevistador.

- Bem, visto que o senhor não sabe perguntar com inteligência, passar bem o senhor também. De burro estou cansado.


- Muito bem. Obrigado pela audiência, boa noite. Luz e glória para todos!!! - Repetiu o entrevistador aquele surrado bordão de fim de entrevista, com a voz empostada.

Vencido, o entrevistador prostou na cadeira do estúdio arrependido de ter nascido. Ao ir para casa ainda pode ver o burro a pastar tranquilamente na saída da cidade. Ele chegou em casa e, sem falar com mais ninguém, pegou uma água mineral com gás e mocozou-se num quarto sem janelas querendo que aquele dia acabasse logo.


Comentários

  1. Pocotoc, pocotoc, pocotoc, pocotoc, pocotoc, pocotoc, pcotoc... hahahahaha... engraçadinho!!
    Ane.

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  2. Pocotó é andadura de equinos. Pocotoc é dos muares. Ane

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