Despedida do Trema

Se você é um frequentador regular aqui desse minifúndio cibernético, deve saber que não sou de replicar mensagens que circulam pela rede. Acredito que o "Compartilhar", "Curtir", "Copiar", "Colar" tem limitado nas mãos de poucos o processo de produção, o estímulo à criatividade e originalidade. 

Mas há exceção em mais uma regra. Trata-se dessa mensagem abaixo, para mim muito criativa, espirituosa, literária. Pena que o e-mail, de tanto ser replicado, perdeu o nome do autor, outra característica marcante da internet também. Atribuem-se a muitas pessoas textos que nada têm a ver com ela. Outras replicadas aos milhares acabam sem autoria reconhecida.

Mas neste caso, o texto que me chega com o singelo "autor desconhecido", na verdade tem autoria atribuída a Lucas Nascimento da Silva e foi publicado originalmente na revista Revista Offline nº 16, voltada para o público jovem universitário:

Despedida do trema

Estou indo embora. Não há mais lugar para mim. Eu sou o trema. Você pode nunca ter reparado em mim, mas eu estava sempre ali, na Anhangüera, nos aqüíferos, nas lingüiças e seus trocadilhos por mais de quatrocentos e cinqüentas anos.
Mas os tempos mudaram. Inventaram uma tal de reforma ortográfica e eu simplesmente tô fora. Fui expulso pra sempre do dicionário. Seus ingratos! Isso é uma delinqüência de lingüistas grandiloqüentes!...
O resto dos pontos e o alfabeto não me deram o menor apoio...

A letra U se disse aliviada porque vou finalmente sair de cima dela. Os dois pontos disse que eu sou um preguiçoso que trabalha deitado enquanto ele fica 
em pé.  
Até o cedilha foi a favor da minha expulsão, aquele C cagão que fica se passando por S e nunca tem coragem de iniciar uma palavra. E também tem aquele obeso do O e o anoréxico do I.
Desesperado, tentei chamar o ponto final pra trabalharmos juntos, fazendo um bico de reticências, mas ele negou, sempre encerrando logo todas as discussões.

Será que se deixar um topete moicano posso me passar por aspas?... A verdade é que estou fora de moda. Quem está na moda são os estrangeiros, é o K e o W, "Kkk" pra cá, "www" pra lá.

Até o jogo da velha, que ninguém nunca ligou, virou celebridade nesse tal de  Twitter, que aliás, deveria se chamar TÜITER. Chega de argüição, mas estejam certos, seus moderninhos: haverá conseqüências! 

Chega de piadinhas dizendo que estou "tremendo" de medo. Tudo bem, vou-me embora da língua portuguesa. Foi bom enquanto durou. Vou para o alemão, lá eles adoram os tremas.

E um dia vocês sentirão saudades. E não vão agüentar!... Nós nos veremos nos livros antigos. Saio da língua para entrar na história.
Adeus,
Trema. 

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