Beijinho no ombro

A passagem da presidente Dilma Rousseff dia 12 de maio, por Ipatinga, rendeu boas piadas. Recebido com descrédito por boa tarde da população, enganada por 30 anos de promessas descumpridas, o anúncio da ordem de serviço para a duplicação do trecho da BR-381 entre Belo Horizonte e Governador Valadares foi, na prática, palco para a troca de farpas entre os grupos que ensaiam a luta pela presidência da República em outubro próximo, o PT e o PSDB. Farpas risíveis de ambos os lados.  

Foi uma canetada, que na prática foi dada mesmo pelo ministro dos transportes, diretor-geral do Dnit e empreiteiras, ato apenas presenciado pela presidente. Poderia ter sido feito em Brasília, transmitido por vídeo e pela Agência Brasil/EBC.

Mas foi preferível montar um circo pré-eleitoral e deslocar um grande aparato governamental. Esperemos agora o resultado e que a presença não seja apenas simbólica. Dos R$ 2,5 bilhões anunciados, quanto essa obra custará daqui a um ano?

Engraçado ouvir a presidente afirmar que “Um país não pode esperar 23 anos para fazer uma rodovia”. E emendar: “Aqueles que criticam qualquer atraso vão ter de responder por que nos oito anos que estiveram à frente do país não fizeram essa rodovia”. 

Ela deve ter duvidado da capacidade de as pessoas lembrarem-se dos fatos. O grupo adversário, na prática, sempre esteve no poder e não fez a rodovia, mas o grupo dela poderia ter feito antes, afinal, está há doze anos no governo, né não, presidenta?  

Tenho aqui guardado um recorte de reportagem datado de abril de 2009. Ainda ministra da Casa Civil, Dilma foi abordada por manifestantes pró-duplicação da BR-381 em Belo Horizonte: “prometo que vou analisar a situação com dois corações, o de ministra e o de cidadã”. Isso tem só cinco anos. 

Meses antes, a então ministra Dilma tentou tirar o projeto de duplicação do Dnit e repassá-lo à Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), cuja intenção era privatizar a rodovia para que a iniciativa privada fizesse a obra. A ideia naufragou porque as empresas analisaram a questão e concluíram que o pedágio seria de no mínimo R$ 14, inviável para aqueles tempos. E o projeto voltou para o Dnit. 

Em 2008 eu e o repórter Tiago Borges estávamos lá, no auditório da Fiemg, em Belo Horizonte, quando os engenheiros anunciaram a inviabilidade da proposta.  

Também soam ridículos os disparos da metralhadora tucana, acionada contra o evento, levantando dúvidas, acusações e avaliações sobre a obra. Seria preciso esperar, primeiro, para saber se vai ser feita ou não. Ou essa série de defeitos apontados já seria um prenúncio de cancelamento do projeto, caso seja o PSDB o vencedor da disputa de outubro?
Foto: Wôlmer Ezequiel na visita presidencial em 12/05. Ipatinga MG
No mais, um registro do fotógrafo Wôlmer Ezequiel (Diário do Aço), do beijo lançado pela presidente à plateia sentada em 1.700 cadeiras do auditório improvisado no estacionamento do Ipatingão, foi simbólico das reais intenções do ato. A presidente deu deu um show para os fãs e petistas e, para a concorrência, um “beijinho no ombro”.

Por fim, uma questão incomoda a quem esteve no local do evento, sem a máscara do ativismo político. Quem pagou a megaestrutura montada com tendas circenses, camarim com banheiro privativo para a governanta-mor, construído em refinada estrutura drywall e gradil que isolou um raio de mil metros em torno da entrada do Ipatingão? E se foi a iniciativa privada quem pagou, com que interesse foi?  

Comentários

Postar um comentário