Perguntas que não se calam

Por onde ando em raros momentos de descanso, nas férias ou algum fim de semana, evito ao máximo dizer com o que trabalho.

Mas as pessoas são curiosas e não falta quem insista em perguntar. Nos últimos 17 meses não tem um só lugar por onde tenha passado – perto ou longe – que alguém não tenha perguntado sobre o assassinato do repórter Rodrigo Neto. 

-De onde você é?
-Ipatinga
-Ah, aquele lugar em que matam jornalistas?

É esse o resumo de um diálogo com um paulista, em férias num lugar a 700 quilômetros daqui, ocorrido janeiro de 2014. Depois, na recente viagem que fiz, dia 25 de agosto passado para a Serra do Caparaó, isso repetiu-se na portaria do Parque Nacional. 

Está muito claro que Rodrigo Neto morreu porque sabia demais. Morreu porque se envolveu pessoalmente com fontes. Aproximou-se demais de bandidos, os da pior espécie, os bandidos que usam distintivo e arma. Gente credenciada pelo Estado usa a força coercitiva para interesses próprios, em detrimento do interesse público.

Ex-policial civil, exonerado por processo que responde por usar carro roubado, foi condenado a 12 anos de prisão por envolvimento no assassinato do repórter Rodrigo Neto, crime de 8 de março de 2014

Entre todos os pecados capitais de um repórter, talvez o mais grave seja a aproximação pessoal da fonte. Também, não sei se seria possível mergulhar tão fundo no pântano dos bastidores policiais, se não fosse levado pelos próprios agentes. Ao que me parece, que não o faz fica no raso das versões oficiais e com menos risco de levar tiro. Disse menos risco, porque a podridão é tanta que mesmo à margem vê-se a mira apontada. 

Em janeiro de 2009, quando viajamos juntos para acompanhar a sessão do Tribunal Regional Eleitoral (TRE-MG) em que o então prefeito Sebastião Quintão teve o mandato cassado por abuso do poder econômico nas eleições de 2008, Rodrigo Neto me contava coisas inimagináveis. 

Ele sabia de casos que envolviam armas e drogas, autoridades que recebiam propina para livrar a cara de bandidos e sempre relatava a falta de justiça nas chacinas, em especial a de Belo Oriente, em que parte de uma família foi dizimada supostamente por policiais, que vingaram a morte de um investigador. 

Por saber demais, foi silenciado a tiros, talvez, por quem ele acreditava que fosse seu amigo. 

Neto também deixava claro que não queria mais ser repórter e, como todos sabem, dedicou-se ao estudo do Direito, pois sonhava em ser delegado de polícia. Para isso, corria atrás de concursos. Certa vez perguntei para ele porque não tinha escolhido o curso de Comunicação. A resposta foi objetiva: “Cansei de passar necessidade, Ferreirão”, disse. 
Calhamaço já possui 13 volumes sobre apuração do Caso Rodrigo Neto, mas não responde. Quem mandou matar?  Por que mandou matar? Quem pilotava a moto que levou o executor do crime?

Esta semana, olhava para o mirrado ex-policial Lúcio Lírio Leal e pensava exatamente que não será surpresa se de hora para outra algo maior vier à tona. Se o ex-policial tem tantos amigos na PC, porque não tratam de apurar a verdade dos fatos e demonstrar que o colega – agora condenado a 12 anos de prisão – é inocente da execução de Rodrigo Neto, como alegou até o fim do julgamento?

Não adianta mandar mensagens desaforadas para jornais, com cobranças de apuração, porque entre o poder de investigação de um jornalista na atualidade e o de um policial, não há como dimensionar a desproporcionalidade. O representante do Estado está anos-luz à frente. 
Riscos: É impossível imaginar que equipe responsável por investigação tenha errado tanto, como resultado de um  açodamento para dar uma resposta diante um caso que tem, até hoje repercussão no plano nacional
E vem pela frente outra parte da Novela, o julgamento do Alessandro Augusto Neves, o Pitote, que a investigação de uma equipe policial de Belo Horizonte aponta como executor do crime contra o repórter. 

Será que o segundo julgamento será feito sem que as investigações apontem o mandante do crime? E a motivação? Quem pilotava a moto que supostamente levou o assassino ao local do crime? Perguntas sem respostas 17 meses depois da execução. Alessandro Pitote, figura sinistra dos bastidores policiais, merece outra análise, em breve.

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