Jericoacoara é tudo de bom

Era mês de agosto quando eu e Andreia rumamos para Jericoacoara, uma vila paradisíaca dentro do Parque Nacional de Jericoacoara, no município de Jijoca de Jericoacoara, litoral norte do estado do Ceará. 
Praia do Centro de Jeri. Restaurantes, águas rasas e esportes a vela
No texto a seguir vamos relatar como foi essa vivência, desmitificar algumas crenças sobre o lugar e relataremos alguns fatos que não vimos em lugar algum, quando pesquisamos sobre a vila antes de irmos passar 20 dias de férias lá. A lista do que tem no povoado litorâneo é extensa, mas vamos resumir em: 

1 - passeios maravilhosos no entorno, 2 - praias paradisíacas, 3 - culinária estonteante, 4 - vida noturna arrasadora na vila, 5 – esportes a vela, em especial o kitesurf. 
Praia da Malhada: apesar de não ter quiosques é muito frequentada e com vento de 40 nós atrai praticante de esportes a vela
A vila de Jericoacoara não tem posto bancário. Em agosto em nenhum lugar era possível sacar dinheiro. Em compensação era possível comprar tudo no cartão, de crédito ou débito. Até vendedores de picolés e água de coco tinham maquininha para receber via cartão. 

Você precisa levar algum dinheiro em espécie para pagar algumas despesas, com transporte, fazer pequenas compras. Dinheiro na mão é garantia de descontos. Leve sem medo, pois não se tem notícias de assaltos em Jeri. 

É importante destacar que eu e Andreia sempre viajamos no estilo “mochilão”, sem agendamentos prévios e preferimos desembarcar nos lugares e fazer uma descoberta a cada esquina. É um estilo despojado, econômico, mas recomendamos que faça dessa forma apenas quem está acostumado a esse estilo, ou o faça sob orientação ou acompanhamento de alguém que já o fez. 

Essa modalidade só é viável com um bom planejamento de rotas, cálculos de tempo, custo-benefício, estudo de clima e aspectos geográficos. Durante esse tipo de viagem é preciso flexibilidade para tomar decisões assertivas, evitar transtornos e assegurar que ao fim de tudo haja alegria e satisfação com cada centavo investido na viagem.  
Vida noturna de Jeri concentra-se em três ruas centrais, entrecortadas por inúmeros becos
Como chegar?

A essa altura, se você decidiu conhecer Jeri, como a vila é chamada na intimidade, é bom saber que há duas formas de se chegar lá. A primeira e mais antiga é partir de Fortaleza, de ônibus, transfer ou carro particular (lembre-se que carros de visitantes não entram na vila). 

A viagem é feita em duas etapas.  A primeira, até a sede de Jijoca de Jericoacoara. A partir daí a viagem é feita em veículos 4x4. A segunda etapa é um tanto quanto off road, em 40 quilômetros por um deserto de areia fina e branca. 

Normalmente, quando a pessoa contrata a viagem a partir de Fortaleza, a segunda parte está incluída e, em Jijoca, faz o transbordo. Se for de ônibus, não se preocupe, pois ao lado da rodoviária de Jijoca partem as picapes 4x4 de tempos em tempos. 
Uma das formas de transporte para os passeios é o Buggy. Você pode contratar de forma compartilhada e dividir o custo médio de R$ 300 por passeio ou contratar privativo
Outra forma, a que usamos, foi voar até o aeroporto do município vizinho, de Cruz. Azul e Gol operam voos diários dos principais centros urbanos para esse terminal. 

O aeroporto fica a 45 quilômetros de Jeri, percurso feito somente em veículos 4x4. Você pode contratar a viagem privativa, numa Hilux ou desembarcar e contratar na hora a viagem compartilhada. Nesse caso, aproveite o percurso para fazer amigos logo na chegada, como fizemos, e pegar dicas importantes. 

Embarcamos com uma jovem mulher da Suiça, que de tanto tempo no Brasil já não tinha mais sotaque ao falar português e conhecia tudo de Jeri. O outro passageiro era um paulistano que chegava pela primeira vez e o guia era o Edi, que nos deu outras dicas importantes. 
Duna do por do sol, perto do centro, é a grande atração dos fins de tarde, em Jeri 
A Vila 
É proibido entrar de carro em Jeri. Mesmo se você chegar numa potente picape 4x4 a Jericoacoara terá que deixar o veículo no estacionamento público, na entrada da Vila. Pelas ruas de lá circulam apenas carros para entrega de mercadorias, prestadores de serviços e os carros do transporte de turistas. 

Para a entrada na vila é cobrada uma taxa de R$ 5 a diária, por pessoa. O pagamento pode ser feito de forma antecipada, via site da prefeitura de Jijoca, ou nos guichês na entrada da Vila. Há filas, em alguns momentos ou dias mais movimentados. 

O centro turístico de Jeri é composto basicamente por três ruas que se estendem de um lado a outro da Vila, sendo que um dos lados onde terminam essas três ruas é a praia. A maior é mais movimentada é a rua São Francisco. 

A vila tem, mais ao sul, a Praia da Malhada, com ondas mais fortes e água mais limpa do que a do centro e, por isso mesmo, preferida por muitas pessoas, embora esteja dentro da área do parque nacional e, por isso, não tem quiosques. Chega-se à praia descendo por uma duna. 
O forró é muito presente na cultura local, mas músicos podem aparecer do nada e dar um show de MPB
As três ruas centrais: São Francisco, do Forró e Principal, são entrecortadas por inúmeros becos. Nos becos e ruas estão concentrados os estabelecimentos comerciais, que vão de supermercados (existem três na via), mercearias, padarias, lanchonetes, lojas de artesanato e restaurantes e muitos restaurantes, que apresentam a mais variada culinária. 

Embora o centro funcione o dia todo, é a noite que a realidade do lugar ganha outra densidade. Jericoacoara inspira música por todos os lados, do tradicional som terra, o forró, da voz e violão com o compasso da MPB, até uma jam session num badalado bar de esquina, na praça central.  

Na São Francisco, mais no centro, à noite encontram-se barracas com comidas e quitutes feitos por nativos. Quer sentir o sabor da culinária local?, então é lá onde estão as barracas. No lado contrário da São Francisco, há um espaço reservado somente para os miçangueiros. 
Ao fim da rua São Francisco, delicie-se com os drinks; você terá dezenas de barraquinhas deles
Gente vinda de várias partes do mundo expõe lá. É da venda das peças que eles sobrevivem. E lá perto também está a “avenida do drink”, já chegando na areia da praia, dezenas de carrinhos de drink posicionados de forma organizada em cada lado da rua, formam um corredor. 

É impossível passar por lá sem tomar um. Dos que experimentamos, o feito na fruta do cacau foi um dos melhores. Não precisa nem falar da alegria contagiante dos vendedores, né? Lá também encontramos filé de lagosta no espeto. Dispensa relatos sobre o sabor, correto?

Por do sol na Pedra Furada; em cada canto de Jeri um cenário estonteante e o por do sol sobre o mar surpreende
Esportes  e pôr do sol 

A praia do centro é mais reservada aos praticantes de Wind surf e outros esportes aquáticos a vela. Já na Malhada o espaço marítimo de ondas fortes e vento intenso é dividido pau a pau com os praticantes de kitesurf e do surf. 

No fim de tarde uma multidão se reúne sobre uma duna, ao norte da praia do Centro para ver o pôr do sol. Nos 20 dias em que ficamos em Jeri não teve um dia em que a duna não tivesse cada centímetro disputado por admiradores do sol poente. É bom lembrar que nessa parte do Brasil o sol se põe sobre o Atlântico, diferentemente da parte mais abaixo do Nordeste e no Sul e Sudeste do país, onde o pôr do sol se dá sobre o continente. 

A propósito, agosto é férias na Europa e a vila recebe milhares de estrangeiros nesse período. Para mim foi uma grande oportunidade de intercâmbio cultural. 

Jangada na lagoa Paraíso; vento forte e constante transformou Jericoacoara e outras localidades do litoral norte do Ceará  num destino importante para a prática de esportes a vela
Origem 
Até os anos 1980 Jericoacoara era uma vila de pescadores habitada por cearenses nativos que viviam em meio ao deserto e à beira do Oceano Atlântico. 

Antes, a pobreza do longínquo lugarejo empurrou muitos dos seus moradores à migração para o Sudeste, principalmente São Paulo. Nesse meio tempo, pessoas de outros países e brasileiros dos grandes centros descobriam o lugar e compravam a preço de coco, por assim dizer, as terras no povoado. 

Passados 40 anos dessa fase Jericoacoara é hoje uma “ilha da fantasia” se comparada aos demais destinos turísticos brasileiros. Sem registro de crimes, isolada no meio do parque nacional e acesso dificultado por causa de um deserto de areia fina e branca, distante dos grandes centros, a vila é um refúgio. 

Os estrangeiros,  principalmente franceses, ingleses, italianos e europeus de outras nacionalidades, além de argentinos e outros sulamericanos dominam o cenário. Havia momentos em que eu e Andreia sentíamos que éramos os únicos a falar português em meio à multidão. 
De todos os pratos espetaculares que saboreamos ficou a lembrança marcante do camarão no abacaxi
Mito e realidade

Diferentemente do que se diz por aí, Jericoacoara não é um lugar onde tudo é caro. Em termos de custo, o destino é democrático como a maioria dos pontos turísticos do Brasil. 

Em agosto podia-se hospedar num camping de R$ 15 a diária, um hostel de R$ 35, uma pousada básica de R$ 150, uma intermediária, de R$ 250, até uma luxuosa, de R$ 1.500.  Há também quartos, casas, apartamentos, quitinetes e bangalôs para serem alugados. 

Da mesma forma é a alimentação. O local possui uns três supermercados, mercearias, peixarias e padarias, todos com preços compatíveis com o mercado de qualquer lugar. Pode-se almoçar um prato gourmet de R$ 150 o casal numa avenida e virar uma esquina e saborear um refeição com o sabor familiar da comida cearense por R$ 15. 

Você escolhe o que cabe no seu orçamento. Caso decida ir no fim de dezembro, janeiro, fevereiro ou carnaval, vai encontrar o lugar superlotado e os preços citados acima podem ser o dobro. 

A propósito da boa gastronomia, dentre tantos pratos que experimentamos, recomendados dois: o baião de quatro, que se come nos restaurantes mais caseiros, e o camarão ao molho de abacaxi. O peixe assado na brasa e o filé de lagosta no espeto são delícias à parte. 

Lagoa de Tatajuba é um dos destinos finais do passeio do lado Oeste.  À esquerda as famosas redes dentro d'água  

Com são os passeios no entorno 

Os famosos passeios, oferecidos à exaustão pelos agenciadores, pelas ruas, se dividem basicamente em dois e podem ser feitos de buggy, a grande sensação do local, quadriciclo ou caminhonetes 4x4. O lado Oeste leva ao litoral, visitação à área de reprodução do cavalo marinho,  travessia na balsa do rio Guriú, Mangue Seco, Lagoa Tatajuba e Lagoa Grande. Nas lagoas o grande atrativo são os restaurantes seco/molhado. Um deles oferece o “cardápio ao vivo”, quando você escolhe o fruto do mar que quer saborear. 

O outro passeio é o do lado Leste, que leva à Pedra Furada, árvore da Preguiça, Preá, Lagoa do Amâncio, Lagoa Azul e Lagoa Paraíso, essa última é onde estão vários restaurantes. O mais luxuoso dele cobra entrada e utilização de algumas das instalações internas. Embora os guias sempre indiquem um ou outro, circule por mais de um restaurante e escolha o que melhor lhe agradar. Combine sempre com o guia o local do encontro para o retorno. 

Há outros passeios que indicamos. Reserve um dia para ir curtir o litoral de Preá, localizado a 25 quilômetros ao Sul. Preá tem se notabilizado por ter um mar mais apropriado para a prática do kitesurf. Se tiver tempo, vá um dia, pelo menos a Camocim e outro ao Delta do Parnaíba, ao Norte.  Pela distância, compensa ficar uns dois ou três dias no Delta. Todas essas viagens podem ser contratadas nas agências em Jeri. 

E outra coisa. Sabe aquelas fotos de redes na água transparente e verde esmeralda? Saiba que não ficam no mar, como muitas pessoas acreditam. Isso só tem nas lagoas de água doce. As praias de Jericoacoara têm água bastante agitadas. Quer calmaria e rede na água?  Vá para as lagoas. 

Haverá dias em que encontrará fila para tirar fotos. O lugar é excelente para registros bem planejados. Dica: acorde cedo, faça uma caminhada e chegue antes das 8h
Pedra furada 

A lendária Pedra furada é outra atração do lugar. Além do passeio Leste, que tem uma parada por lá, o local pode ser visitado sem guias. Vimos de lá um pôr do sol sensacional. Há basicamente dois acessos: Mais a Leste, por um caminho bastante demarcado pelo tráfego de pessoas e de charretes “Uber”. 

A partir da praia da Malhada, via Morro do Serrote, que também é outro ponto de admiração do pôr do sol. A trilha via Serrote é a mais recomenda, por causa da beleza do mar azul, que pode ser avistado do alto dos penhascos. Se a maré estiver baixa é possível ir pela areia. Aproveite para localizar o Poço da Princesa, no meio do Caminho, onde há também uma caverna sensacional no paredão rochoso. 

Por fim, se há uma frase que podemos citar para encerrar esse relato, certamente é essa: “Jeri é tudo de bom”. 
A lendária árvore da preguiça, ou árvore tombada, no caminho do passeio leste e na estrada para Preá

Esse é o ponto máximo onde carros podem ir, na entrada da vila. Daqui para frente somente veículos autorizados
Travessia do rio Guriú, no passeio do lado oeste
Nos arredores da vila há dunas com até 200 metros de altura. Uma caminhada no deserto te leva ao topo delas. Um lugar perfeito para meditação ou contemplação à beira do Atlântico




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