Uma ode à falta de educação

O vídeo de uma peça publicitária, em que um homem de meia idade oferece planos de seguros para uma jovem, que o atende à porta com um copo de sorvete na mão, sugando o alimento com tanta força, que o barulho abafa a fala do “tio”, é sintomática de uma juventude fraca, que não ouve ninguém e não tem educação, desconhece o que é gentileza e não se importa com o outro. E o pior de tudo é a publicidade incentivar ou louvar essa descortesia.  


O homem tem aparência de cansado, marcas de suor no rosto, cabelos desgrenhados e fala arrastada e cansada. Enquanto ele fala, a jovem suga o sundae com um barulho insuportavelmente chato. Não há diálogo, só o monólogo do vendedor de seguros e o grunhido do sorvendo sugado.

Essa publicidade apareceu-me essa semana seguidas vezes no Youtube, Spotify, entre outros aplicativos. Quando digo que o vídeo é sintomático de uma geração que está presa num mundo paralelo, submersa no “mundo líquido”, de Zygmunt Bauman, não é por acaso. 


Essa é uma geração que não muito raro entra em depressão quando é chamada à atenção por qualquer motivo, não se importa com os outros e não foi preparada para ouvir "não". 
Em peça publicitária tosca, vendedor de seguros é ignorado ao som de sorvete sugado em canudinho
Causa-me grande estranheza tal comportamento, pois fui educado com o ensinamento de ouvir o que o outro fala, e depois responder ao que me foi perguntado. É verdade que às vezes a tolerância tem limites, mas cara a cara faz bem ouvir e responder a quem nos fala. 

E foi justamente ao pesquisar a respeito desse vídeo que soube de algo reconfortante. Há inúmeros comentários indignados com a cena tosca, uma receita que os publicitários já aplicaram em outra peça e procuram tirar proveito da polêmica.

Os mudos

Recentemente fui fazer entrevistas com jovens que esperavam a abertura das portas de uma escola para fazer a prova do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). Eles não sabiam o que falar. Absortos em seus smartphones, com fones intra auriculares enfiados nos ouvidos, ficaram mudos. 


O desespero estampado na cara de uma mãe, olhando aflita à filha que não sabia responder a uma pergunta simples, levou-me a dizer a ela que não se preocupasse.

Por fim cabe responsabilizar a marca internacional de fast food, que colocou no ar a propaganda que, claramente, incentiva a falta de educação e falta de empatia. Já estava fora do meu cardápio e estará, mais do que nunca, defenestrada.


A propósito, depois que postei esse texto, no dia 30, descobri que há outros vídeos tão podres quando o do "tio do seguro". Em um deles, um jovem tenta tocar violão ao lado de uma fogueira, e a "voz e violão" é superada pelo ruído do sundae sendo sugado do corpo.  

Comentários

  1. Olá Alex.. Não é de hoje que isso acontece. Vivemos uma inversão de valores em todo o globo. Com exceção das comunidades menores, a vida urbana impõe um ritmo de vida como você narrou, de gente individualista, que não se importa com os outros. Moro em um prédio com 24 apartamentos há 10 anos. Tem pessoas que aqui residentes, lado a lado e não se cumprimentam. Antes eu cumprimentava, com um bom dia, boa noite, mas depois entendi que as pessoas não queriam nem responder a isso. Sabe o que ocorreu? Não se cumprimentam, não se convivem, e somente quando alguma coisa muito grave conversam uns com os outros. Isso estamos falando de adultos. Imagem entre jovens e adultos? Sua citação dos fones de ouvido é perfeita, para mostrar uma geração que está vivendo num mundo paralelo, ignorando inclusive o som ao redor. Reconhecer os sons ao nosso redor era necessário para sobrevivência. Antes indicava a proximidade de um curso d'água para matar a sede, ou a aproximação de um animal ou de uma tempestade. E hoje? Abraço. Marcos.

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